quinta-feira, 21 de agosto de 2008

DE DORI PARA DORIVAL

"E assim adormece esse homem
Que nunca precisa dormir pra sonhar
Porque não há sonho mais lindo do que sua terra" (não há).

domingo, 8 de junho de 2008

CAMPECHE, O POUSO DO ZÉ PERRI EM FLORIANÓPOLIS








A Praia do Campeche, localizada no sul da Ilha em Florianópolis, tem uma peculiariedade curiosa na sua história. Na década de 1920 foi construído alí um campo de pouso do correio aéreo francês que servia de base de reabastecimento dos aviões que faziam o vôo entre Paris e Buenos Aires. Consta que o escritor Saint-Exupéry, comandante desta rota, de tanto pousar alí, tornou-se bem conhecido dos pescadores, antigos habitantes do local e era conhecido como o “Zé Perri”. Não existe prova documental deste fato, mas a jornalista Márcia Barreto investigou a história e entrevistou Charles Edgar Moritz (antigo curador do Hospital de Caridade de Florianópolis). “Ele contou ter encontrado Exupéry em bailes do Lira Tênis Clube ”, diz Márcia. Moritz não pôde provar o que disse sobre Exupéry, segundo Márcia, “mas pudemos comprovar com documentos quase todas as outras informações que nos passou”.

O Campeche, cuja origem do nome tem duas versões - tanto pode ser “champ de pêche” (campo de pesca), como aviadores chamavam o lugar ou o vegetal utilizado para tinturaria que deu nome à ilha em frente à praia, que já era denominada assim desde o século XIX – também é conhecido pela pesca artesanal da tainha, que acontece da segunda quinzena de maio até o final de junho “depois do vendaval”. Os ventos fortes que sopram em diagonal entre a ilha e o continente, aliás, permitem a formação de ondas longas, muito apreciadas pelos surfistas, que as apelidaram de “as direitas” do Campeche.

Esta bela praia, cheia de história e estórias, inspirou o pequeno ensaio fotográfico acima.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

FRANK GEHRY E NIEMEYER



Quando vi o Museu Guggenheim em Bilbao pela primeira vez, pessoalmente, achei-o menos surpreendente do que nas fotos, nas quais parecia uma alucinante e futurista escultura de titânio. Era difícil, mesmo para um arquiteto, acreditar que poderia haver uma “ordem arquitetônica” alí e que a revolução formal pretendida resultasse em beleza para olhos acostumados à tradição da arquitetura limpa de inspiração modernista. Quando cheguei perto da obra, apesar de só poder apreciá-la de fora (não pude entrar, pois o museu estava fechado no dia em que o visitei) consegui compreendê-la melhor, mas mesmo assim ela não me cativou de cara como outras grandes obras arquitetônicas, cuja beleza apreciada de perto, muitas vezes, me emocionara. O prédio - ou aquela escultura na qual se podia penetrar e exercer atividades - me pareceu uma construção extremamente tecnológica e portanto fria. Aquelas formas mirabolantes só poderiam ser projetadas e construídas com a ajuda de poderosos programas de computação gráfica e alto desenvolvimento tecnológico de materiais, portanto com um suporte técnico e um custo muito elevados. Apesar do espetáculo urbano que o projeto provocou, atraindo investimentos urbanos e turísticos para Bilbao e potencializando o efeito midiático da “arquitetura de resultados”, a euforia gehryana não me contagiou. Não havia nela a simplicidade, a leveza e a espontaneidade do traço arquitetônico de um Niemeyer, por exemplo.

Esta impressão modificou-se bastante quando assisti ao documentário “ Sketches of Frank Gehry” de Sidney Pollack. Ao invés de seguir vendo Gehry como um contraponto a Niemeyer, passei a vê-lo como um continuador deste, (embora Gehry provavelmente não se veja assim), no rompimento da rigidez formal da arquitetura (clássica e moderna também) e na incorporação da forma livre como expressão arquitetônica acima de tudo. Ou acima da função, de acordo com a conhecida polêmica entre arquitetos formalistas e funcionalistas. Assim como Niemeyer, Gehry, antes de ser um arquiteto é um genial escultor e trata desta forma a obra arquitetônica. Há discordâncias quanto a “boa arquitetura” ser, antes de tudo, formal, mas há de se reconhecer a grande plasticidade dos projetos de Gehry e Niemeyer. É claro que nem sempre esta plasticidade significa beleza para a maior parte das pessoas. Ou seja, Gehry e Niemayer também projetam obras que são consideradas feias e sem a genialidade de suas obras primas.

Interessante é vermos ambos - Gehry e Niemeyer – como homens simples e poetas do traço livre, que preferem conceber suas obras a partir de croquis desenhados a mão. Nenhum dos dois desenha em computador, embora tenham equipes de profissionais altamente treinados em sofisticadas tecnologias a os assessorar. Os dois pensam a arquitetura, desde a concepção do projeto, como volume plástico e objeto escultório que deve proporcionar surpresa e emoção às pessoas em primeiro lugar. O que os diferencia: Em Gehry é o arrojo das formas curvilíneas e o uso sofisticado de materiais “high tech” que cria a surpresa arquitetônica, em Niemeyer é a singeleza e sofisticação do traço curvo e o desenho limpo que levam à beleza. Gehry esculpe no metal – material caro e sofisticado da arquitetura de impacto midiática do Sec XXI , Niemeyer no concreto– material barato e terceiromundista, a pedra transformada em arte edificada pela arquitetura brasileira modernista da década de 1950/60.

Gehry, como ele mesmo afirma, consequiu dar vazão ao seu poder criativo e conseguiu ousar na profissão com o auxílio da terapia . Niemeyer sempre afirmou que dá menos importância à arquitetura – a qual exerce diariamente até hoje com seus 100 anos - do que a vida. Conclui-se que é o aspecto humano que diferencia estes mestres dos demais profissionais. Há razão, contudo, em muitas críticas a eles feitas e muitas vezes se percebe contradição na humanidade que desejam para a sua arquitetura e no que ela, de fato, representa, enquanto símbolo de monumentalidade e de poder. Porém contradição, desigualdade, paradoxo, beleza e caos são traços próprios da arte (arquitetura incluída) e não se pode cobrar coerência dela, sob pena de esterelizá-la.
PS - a foto das obras de Niemeyer (Museu da República e Catedral de Brasília) são de autoria de Júlio Reis Jatobá

quinta-feira, 20 de março de 2008

A Tenebrosa Era da Inocência


O personagem principal de a Era da Inocência (o título original - “A Idade das Trevas” traduz melhor a mensagem do diretor, mas espantaria o público que pensa tratar-se o filme apenas de uma comédia ) chama-se (Jean-Marc) Leblanc – “o branco” e está constantemente fugindo do seu mundo tenebroso por meio de suas fantasias estaparfúdias pontuadas por desejos sexuais e de grandeza reprimidos. Mas “ Le Blanc” tanto pode ser o sujeito “claro” que rejeita um mundo cego pela estupidez e pela hipocrisia quanto alguém com realizações “em branco” e uma vida vazia (embora cheia de ilusões perdidas ou irrealizáveis). Leblanc é o alterego do diretor Denis Arcand em fuga da hipocrisia e mediocridade que cerca o mundo das celebridades, no qual ele mesmo se insere, mas também é o homem comum massacrado e transtornado pela indiferença, impaciência, sarcasmo e impiedade da nova idade (média) das trevas. Leblanc é um funcionário público pago por uma sociedade politicamente correta que se dedica a “ouvir” os cidadãos injustiçados por ela mesma. Mas por ser também uma vítima desta sociedade, Leblanc é complementamente incapaz de resolver qualquer dos problemas a ele levados por pessoas tão semelhantes a si mesmo. Por isso age, tal qual seus próprios carrascos, com cruel ironia diante destes seres socialmente desesperançados. A Era da Inocência pode não seu um filme tão empolgante para a crítica como foram “O Declínio do Império Americano” e “As Invasões Bárbaras” mas soa como um desabafo de Denis Arcand , e não deixa de ser, tal como seus antecessores, uma reflexão tão ácida quanto pertinente da sociedade contemporânea.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

CANTORA BRASILEIRA NO MELHOR DISCO DE 2007



Possivelmente poucos brasileiros conhecem a cantora brasileira Luciana Souza. Pois ela é uma das ilustres convidadas de Herbie Hancock no álbum de jazz River – The Joni Letters que ganhou no último dia 11 de fevereiro o prêmio Grammy de melhor disco de 2007. Notem que não foi o prêmio de melhor álbum de jazz, mas o de melhor disco do ano, desbancando astros da pop music e do rock. Não é pouco, pois isto é fato raro e surpreendente em um ambiente marcado pela música comercial e de péssima qualidade. De fato, é a segunda vez que o um trabalho jazzístico ganha o Grammy de melhor disco do ano. A outra vez foi em 1965 com o álbum de Stan Getz e João Gilberto Getz/Gilberto. Coincidentemente com a participação de um outro brasileiro que a partir daí transformaria os rumos da música popular no seu país e no mundo.

A Bossa Nova reinventou a MPB, reoxigenou o jazz e lhe deu a beleza melódica de Jobim, Donato, Alf, Lyra, Menescal, Powell, Lobo,Valle, Eça, Blanco, Castro Neves e tantos outros. E, é claro, a voz, o violão e o singular modo de cantar de João Gilberto. Pois agora um disco de um renomado jazzista, que começou sua carreira tocando com Miles Davis, deu belas canjas em discos de Milton Nascimento e é um dos grandes mestres do jazz contemporâneo, leva o mesmo prêmio com um disco talvez tão revolucionário quanto foi Getz/Gilberto. Nele Hancock obtém êxito naquilo que muitos músicos perseguem: unir a sofisticação do jazz com o pop sem abrir mão de uma música de qualidade excelente. Não é algo simples. Na realidade é como juntar água e óleo. Apesar do pop flertar com o jazz desde que este deixou de ser uma música purista para absorver influências de vários gêneros musicais, a alquimia entre jazz e pop nem sempre deu certo, desagradando tanto a jazzistas quanto a consumidores de música pop. Hancock se saiu bem na sua empreitada porque une a sofisticada beleza de seus arranjos executados por excepcionais instrumentistas do quilate de Wayne Shorter, Dave Holland, Vinnie Colaiuta e Lionel Loueke às vozes de cantoras populares no circuito do jazz como Norah Jones, Corine Bailey Rae, a própria Joni Mitchel (homenajeada e autora da maior parte das músicas), Tina Turner (ícone do rock belamente revigorada em uma das mais belas canções do disco) e Luciana Souza, a quem Hancock agradece a “habilidade e precisa navegação” em uma exaltação a sua performance tecnicamente perfeita e emocionalmente viajante na canção “Amélia”.

Mas quem é Luciana Souza afinal ? Nascida em Sao Paulo é formada em Composição Jazzística por Berklee e tem uma carreira sólida nos EUA. Já foi nominada ao Grammy como melhor cantora de jazz por três vezes (2002, 2003 e 2005) e já gravou e se apresentou com vários grandes nomes do Jazz. Apesar disto e de cantar muitíssimo bem tanto em inglês quanto em português e, principalmente, música brasileira, Luciana é muito pouco conhecida no Brasil. Aliás ela até tentou carreira aqui, mas sem sucesso voltou às terras do Tio Sam, onde foi melhor acolhida e hoje é considerada celebridade no meio jazzístico. Como João Gilberto e Jobim, Luciana em sua carreira ascendente também pode tornar-se um dos grandes gênios musicais brasileiros a triunfar no circuito da música jazzística internacional. E aí, quem sabe, a reconheceremos no Brasil. Por enquanto seu desconhecimento por aqui parece ser fruto em parte da desinformação que brasileiros têm sobre a qualidade dos seus artistas mais talentosos no exterior e em parte por um certo desprezo por estes artistas fazerem uma carreira no exterior, o que revela um misto de xenofobia e preconceito.