segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

FRANK GEHRY E NIEMEYER.


Quando vi o Museu Guggenheim em Bilbao pela primeira vez, pessoalmente, achei-o menos surpreendente do que nas fotos, nas quais parecia uma alucinante e futurista escultura de titânio. Era difícil, mesmo para um arquiteto, acreditar que poderia haver uma “ordem arquitetônica” alí e que a revolução formal pretendida resultasse em beleza para olhos acostumados à tradição da arquitetura limpa de inspiração modernista. Quando cheguei perto da obra, apesar de só poder apreciá-la de fora (não pude entrar, pois o museu estava fechado no dia em que o visitei) consegui compreendê-la melhor, mas mesmo assim ela não me cativou de cara como outras grandes obras arquitetônicas, cuja beleza apreciada de perto, muitas vezes, me emocionara. O prédio - ou aquela escultura na qual se podia penetrar e exercer atividades - me pareceu uma construção extremamente tecnológica e portanto fria. Aquelas formas mirabolantes só poderiam ser projetadas e construídas com a ajuda de poderosos programas de computação gráfica e alto desenvolvimento tecnológico de materiais, portanto com um suporte técnico e um custo muito elevados. Apesar do espetáculo urbano que o projeto provocou, atraindo investimentos urbanos e turísticos para Bilbao e potencializando o efeito midiático da “arquitetura de resultados”, a euforia gehryana não me contagiou. Não havia nela a simplicidade, a leveza e a espontaneidade do traço arquitetônico de um Niemeyer, por exemplo.

Esta impressão modificou-se bastante quando assisti ao documentário “ Sketches of Frank Gehry” de Sidney Pollack. Ao invés de seguir vendo Gehry como um contraponto a Niemeyer, passei a vê-lo como um continuador deste, (embora Gehry provavelmente não se veja assim), no rompimento da rigidez formal da arquitetura (clássica e moderna também) e na incorporação da forma livre como expressão arquitetônica acima de tudo. Ou acima da função, de acordo com a conhecida polêmica entre arquitetos formalistas e funcionalistas. Assim como Niemeyer, Gehry, antes de ser um arquiteto é um genial escultor e trata desta forma a obra arquitetônica. Há discordâncias quanto a “boa arquitetura” ser, antes de tudo, formal, mas há de se reconhecer a grande plasticidade dos projetos de Gehry e Niemeyer. É claro que nem sempre esta plasticidade significa beleza para a maior parte das pessoas. Ou seja, Gehry e Niemayer também projetam obras que são consideradas feias e sem a genialidade de suas obras primas.

Interessante é vermos ambos - Gehry e Niemeyer – como homens simples e poetas do traço livre, que preferem conceber suas obras a partir de croquis desenhados a mão. Nenhum dos dois desenha em computador, embora tenham equipes de profissionais altamente treinados em sofisticadas tecnologias a os assessorar. Os dois pensam a arquitetura, desde a concepção do projeto, como volume plástico e objeto escultório que deve proporcionar surpresa e emoção às pessoas em primeiro lugar. O que os diferencia: Em Gehry é o arrojo das formas curvilíneas e o uso sofisticado de materiais “high tech” que cria a surpresa arquitetônica, em Niemeyer é a singeleza e sofisticação do traço curvo e o desenho limpo que levam à beleza. Gehry esculpe no metal – material caro e sofisticado da arquitetura de impacto midiática do Sec XXI , Niemeyer no concreto– material barato e terceiromundista, a pedra transformada em arte edificada pela arquitetura brasileira modernista da década de 1950/60.

Gehry, como ele mesmo afirma, consequiu dar vazão ao seu poder criativo e conseguiu ousar na profissão com o auxílio da terapia . Niemeyer sempre afirmou que dá menos importância à arquitetura – a qual exerce diariamente até hoje com seus 100 anos - do que a vida. Conclui-se que é o aspecto humano que diferencia estes mestres dos demais profissionais. Há razão, contudo, em muitas críticas a eles feitas e muitas vezes se percebe contradição na humanidade que desejam para a sua arquitetura e no que ela, de fato, representa, enquanto símbolo de monumentalidade e de poder. Porém contradição, desigualdade, paradoxo, beleza e caos são traços próprios da arte (arquitetura incluída) e não se pode cobrar coerência dela, sob pena de esterelizá-la.
PS - a foto das obras de Niemeyer (Museu da República e Catedral de Brasília) são de autoria de Júlio Reis Jatobá

2 comentários:

Anônimo disse...

Excelente, aqui mais amplo. Vou adicionar teu blog ao meu. Abçs.

Unknown disse...

Obrigado,cintia.